Theodor Koch-Grünberg (9 de Abril de1872 em Hesse, Alemanha - faleceu de malaria em 8 de outubro de 1924, na maloca Vista Alegre em Boa Vista, Brasil) foi um etnólogo e explorador que construiu uma importante obra sobre os povos indígenas amazônicos, destacando-se os Pemón (Taurepang) da Venezuela e vários povos brasileiros. Nasceu em 09 de abril de 1872 em Grünberg na Alemanha e faleceu em 08 de outubro de 1924 na maloca Vista Alegre, Roraima, no Brasil.
Veio a primeira vez ao Brasil em 1896 como membro da expedição liderada por Hermann Meyer, que tentou atingir as nascentes do rio Xingu. De 1903 a 1906 viajou pela bacia do Rio Negro, registrando aspectos das culturas indígenas da região, trabalho de que resultou a obra Zwei Jahre Unter Den Indianern. Reisen in Nord West Brasilien, 1903-1905 (Dois anos entre os indígenas: viagens no noroeste do Brasil, 1903-1905). De 1911 a 1913 viajou por todo o Planalto das Guianas e realizou um registro único das sociedades indígenas com que conviveu, se tornando um dos grandes nomes da etnologia brasileira. A expedição partiu de Manaus, subiu o Rio Branco, chegou ao Monte Roraima e à Serra Parima, percorreu os rios Caura, Ventuari e Orinoco até San Fernando de Atabapo, na Venezuela, e de lá desceu pelo canal Cassiquiare até o rio Negro e novamente Manaus. Esse trabalho se tornou o livro Vom Roroima Zum Orinoco (De Roraima ao Orinoco), publicado em 1917 em cinco volumes que estão disponíveis na forma digital Biblioteca Brasiliana Digital USP.
Os cinco volumes da edição original trazem:
- Volume I -Diário da viagem pelo rio Branco até Roraima, pelos rios Uraricuera, Ventuari e Orinoco. Tradução para o português: Do Roraima ao Orinoco, Vol. I, São Paulo, Unesp, 2006.
- Volume II – Mitos e lendas dos grupos Taulipang, Macuxi e Wapishana de Roraima. Tradução para o português: “Mitos e lendas dos índios Taulipang e Arekuná”. Revista do Museu Paulista, N.S. VII, São Paulo, 1953, pp. 9-202.
- Volume III – Etnografia e musicologia dos Taulipang.
- Volume IV – Linguística comparativa de dezenas de etnias encontradas entre os rios Banco e Orinoco.
- Volume V – Atlas fotográfico dos tipos indígenas encontrados.
Entrevista com Renan Pinto (Editor da EDUA - UFAM)
Começo da Arte na Selva, de Theodor Koch-Grünberg.
17 de outubro de 2009
Da mesma forma como procedeu em suas pesquisas por vários rios do Amazonas, sem alarde e longe da “civilização”, assim passou a data dos 85 anos da morte do alemão Theodor Koch-Grünberg, em 8 de outubro de 2009.
O desprezo por Grünberg e pelo trabalho que realizou no Amazonas em três períodos distintos, nas primeiras duas décadas do século passado (1903 a 1905; 1911 a 1913 e 1924), além dos livros que publicou com suas descobertas, parece ser crônico, pois durante décadas o rico material etnográfico (estudo da cultura material e espiritual dos povos nativos) e antropológico (classificação dos caracteres físicos desses grupos humanos) que adquiriu entre vários povos indígenas da região permaneceu esquecido e ignorado no Brasil e não menos no Amazonas, de onde deveriam surgir os maiores interessados em conhecer e divulgar as pesquisas do alemão.
Theodor Koch-Grünberg nasceu na cidade de Grünberg, na Alemanha, em 9 de abril de 1872. Desde cedo se interessou por aventuras em terras distantes e bravias e assuntos relacionados com índios, principiando por se aprofundar em filologia (estudo dos documentos escritos e da forma de língua que eles nos dão a conhecer).
De acordo com o professor e pesquisador cultural Antonio Alexandre Bispo, “em 1903, Koch-Grünberg realizou os preparativos para uma viagem ao Amazonas patrocinada pelo Museu de Etnologia de Berlim. Essa viagem trouxe-o ao rio Negro, alcançando o território do Caiary-Uaupés; passando pelo Apaporis e Japurá, retornando em maio de 1905 a Manaus”.
Durante essa expedição, registrou 40 dialetos, procurando penetrar através da língua e da arte na vida psíquica dos índios, tomando parte também em festas com danças e cerimônias fúnebres.
De volta ao Museu de Berlim, trabalhou com o material coletado, publicando estudos tais como Começo da Arte na Selva (1905), Desenhos Sul-Americanos em Rochas (1907); Dois Anos entre os Indígenas (1909), além de vários artigos e trabalhos linguísticos.
O retorno
Em 1911, Grünberg retornou à América do Sul, dirigindo-se ao Norte do Brasil e à Venezuela. De Manaus subiu o rio Negro e o rio Branco. “À estadia agradável entre os taulipang, na região de Roraima, seguiu-se uma viagem difícil pelo Uraricoera, com permanência entre os yekuaná e uma tentativa frustrada de chegar às cabeceiras do Orinoco para, finalmente, atingir esse rio pelo Ventuari e retornar pelo Cassiquiare”, diz Antonio Bispo.
Nessa segunda expedição, Grünberg se utilizou de um fonógrafo para gravar cantos indígenas. Para acostumá-los com um aparelho que podia reproduzir a voz humana e a música, trouxe rolos com gravações para que eles as ouvissem. Antonio Bispo acrescenta que “nessas apresentações, constatou que os índios gostavam da audição de música européia. Assim, grupos de wapichana, taulipang e macuxi tomaram contato com peças populares e de operetas de compositores alemães como Franz Lehar e Paul Lincke. Repetidas várias vezes, a pedido dos indígenas, logo as crianças já cantavam as melodias sem erro e, lógico, pronunciando mal o texto alemão”.
Entusiasmado, Koch-Grünberg escreveu sobre o fato: "eu executei todos os cantos para um público numeroso e grato. Pessoas nuas e semi-nuas, em grande quantidade, se agruparam em pictórico semi-círculo à parede da grande ante-sala da minha cabana, e ouviram com atenção o canto do seu chefe, reproduzido pelo gramofone. Pitá ri satisfeito quando ele escuta a si próprio. Algumas mulheres, assustadas, tapam com as mãos a face ou a boca, outras postam as mãos como para rezar, e são tão piedosas como há pouco no serviço divino do padre”. O médico-feiticeiro, chamado pelo chefe do grupo, não quis, entretanto, cantar à ‘máquina’, perguntando desconfiado, por que Grünberg desejaria levar consigo a sua voz.
A última expedição
Em sua terceira e última visita à região, em 15 de setembro 1924, Koch-Grünberg lamentou a dizimação das populações indígenas pelas epidemias e pela influência de garimpeiros.
Desta viagem, o pesquisador elaborou vocabulários de 23 tribos, textos de cantos medicinais e de magia, lendas e mitos na língua original e tradução, observações escritas e visuais sobre os costumes e usos, além de fonogramas de cantos e filmes de danças. Publicou De Roraima ao Orinoco, em cinco volumes, sendo-lhe concedido o título de professor pela Universidade Freiburg.
Ainda em 1915, após ser nomeado diretor científico do Museu de Etnologia em Stuttgart, tornou-se responsável pelo departamento sul-americano, porém, em 1924, foi despedido pela associação que mantinha o museu. Antonio Bispo diz que, exatamente nesse ano, Grünberg foi “convidado pelo pesquisador americano Hamilton Rice a acompanhá-lo em uma nova viagem às cabeceiras do Orinoco, essa expedição deveria ser dividida em dois grupos, partindo um do Orinoco e outro do Uraricoera em direção à Serra Parima. Grünberg deveria dirigir a parte que ia pelo Uraricoera, enquanto a outra parte seria liderada por Rice, sua mulher e uma comissão médica da Universidade de Havard”.
O alemão partiu de Hamburgo no dia 6 de junho de 1924 e no dia 20 de agosto já subia o rio Negro, entrando pelo rio Branco até Vista Alegre onde pegou malária, morrendo no dia 8 de outubro de 1924, aos 52 anos de idade.
Um velho baú
Em Manaus, o responsável pela edição dos três livros de Koch-Grünberg, únicas existentes no Brasil, foi o sociólogo Renan Freitas Pinto, quando diretor da EDUA (Editora da Universidade Federal do Amazonas). “Desde a minha época de ginásio lera sobre Grünberg, nos livros de Mário de Andrade que, aliás, escreveu Macunaíma baseado em relatos do pesquisador sobre lendas e mitos de povos habitantes da atual região de Roraima. Não entendia porque outros antropólogos menos importantes que Grünberg eram publicados e ele não. Quando fui dirigir a EDUA, não medi esforços para buscar suas obras, mandar traduzi-las para o português e editá-las”.
Foi assim que foram surgindo, ineditamente em português, as obras do alemão: Dois Anos entre os Indígenas (2005); A Distribuição dos Povos entre rio Branco, Orinoco, rio Negro e Yapurá (2006), tradução de Erwin Frank, e Começos da Arte na Selva (2009), tradução de Casimiro Beksta.
Para Renan, “a morte prematura de Koch-Grünberg certamente o impediu de realizar importantes planos de pesquisa, cujas contribuições seriam esclarecedoras para o conhecimento dos povos indígenas e para a publicação de novas obras, como foram aquelas que o consagraram como um dos fundadores da antropologia brasileira, e de modo particular, dos povos indígenas da Amazônia”. Apesar de ter morrido há 85 anos, a visão humanista de Grünberg sobre a destruição dos povos da Amazônia retrata a mesma dos dias atuais. “Um material humano capaz de desenvolver-se e que pode ser aniquilado pela brutalidade dessa moderna cultura da barbárie”.
Os únicos vestígios da passagem de Theodor Koch-Grünberg por Manaus podem ser vistos no museu do IGHA (Instituto Geográfico e Histórico do Amazonas), onde um baú com alguns poucos pertences (chapéu, roupas e diário) permanecem guardados desde quando seus restos mortais foram trazidos de Vista Alegre, alguns anos após sua morte, para serem enterrados na cidade, no cemitério São João Batista.
Fonte: Site da UFAM